Mas, tal como eu dizia, ao vermos os pirilampos tremíamos de medo daquelas aparições e temíamos que fosse algo pior. Durante o tempo que ali permanecemos, vimos passar, atravessando a estrada, vários tipos de animais da selva africana. Quatro horas mais tarde, o choufer apareceu e lá seguimos viagem. Passado algum tempo, finalmente chegámos à cidade da Gabéla. Dali seguimos para as grandes fazendas de café, de Mário da Cunha Brito, pai do Jorge Brito que foi dirigente do Benfica. Era este senhor, patrão do meu pai entre 1959 e 1968, que injectava muito capital no Benfica e construiu um Hospital na freguesia da terra onde eu nasci. Mário da Cunha Brito filho predilecto e grande benemérito desta freguesia. Para além disso, também nas suas fazendas, construiu, para os trabalhadores brancos e negros, bairros com boas habitações, hospitais com médicos e enfermeiros. Quando chegámos à casa onde vivia o meu pai, na fazenda Quitona, colocámos lá as nossas coisas e depois ele levou-nos a uma casa feita de pau e coberta com ramagem de palmeira, e qual não foi a nossa grande surpresa e admiração, quando ao olharmos para o tecto dessa barraca vimos dezenas de grandes cachos de bananas maduras ali penduradas. Foi comer até fartar! Lá ficamos a viver, naquela fazenda de café, entre grandes árvores centenárias, nos morros (montanhas) do Amboim, Cuanza Sul, perto das belas cachoeiras (quedas de água) onde o ar e as águas eram puras e os únicos barulhos que se ouviam eram os cantares dos belos pássaros que nidificavam por entre a ramagem das palmeiras, dos banzes, bananeiras, taculas, mulembas e cafeeiros. Aquela era uma zona de muito cacimbo (nevoeiro). Nalgumas manhãs, ele era tão denso que apenas se conseguia vislumbrar o que quer que fosse a uma distância de vinte metros. Só por volta do meio-dia, quando o Sol rompia víamos aquelas árvores repletas de pombos verdes. Eram tantos que por vezes havia árvores que continham mais pombos do que folhas. Estes viajavam em tão grande velocidade que perante o cacimbo não tinham tempo de parar antes de embaterem contra a nossa casa, que com a sua parede branquinha se confundia com o nevoeiro e acabavam por morrer. Nesta fazenda havia um grande terreiro (Eira de secagem) com alguns 1000 quadrados de terra batida que servia para secagem do café. Em volta desse terreiro havia muita bananeiras, ananazeiros, abacateiros, mangueiras, goiabeiras, papaeiras, mamãozeiros, pitangueiras e outros.
De vez em quando, víamos passar por entre a selva, com plantações de café por baixo de arvoredo de grande porte, um comboio movido a lenha que fazia o trajecto de Porto Amboim à cidade da Gabéla, transportando mercadorias e pessoal. Embora fosse muito lento, este dava uma imagem bonita por entre a selva e dos morros do Amboim. A cidade da Gabela e o Porto Amboim eram ligados por um caminho-de-ferro onde circulava este comboio movido a lenha. Dois homens seguiam, de pé, entre a fornalha e a vagonete que transportava a lenha. Iam colocando lenha e mantendo a chama bem acesa para que a caldeira de água continuasse a ferver, tipo panela de pressão, para que, com essa pressão, empurrasse os pistões para cima e para baixo a fim de, através dos êmbolos, fizesse mover as rodas. Nas subidas teriam que dar força á fogueira, na descida teriam que, com um balde, atirar com água para a fogueira acalmasse e assim obrigaria o comboio a andar menos. Lá subia e lá descia, por entre a floresta deixando para traz muito fumo, o comboio apitando e fazendo “Pouca terra Muita terra, Pouca terra muita terra… e toda a floresta, nas encostas dos morros do Amboim, sorria ao ver aquele Comboio passar. Nas aldeias, à beira da linha, toda a criançada corria para verem o bonito comboio passar. Pipiiiiiiiiiiiiiiiiii Pipiiiiiiiiiiiiiiiiii… e no Chindinde parava para sair e entrarem passageiros. Ali, nestas fazendas do Congulo, na “Quitona”, estávamos no mato, isolados de toda a civilização, não havia sequer uma escola por perto, mas sentia-me na floresta do "Tarzam", era o mais lindo lugar que alguém poderá imaginar!
Quando a Filomena fez um ano, o meu pai comprou-lhe um triciclo, mas assim que eu me sentei nele, com uma perna no chão com a qual me empurrava, e a outra, na qual não tenho força, que apoiava no quadro do triciclo, descobri que aquela era uma boa e facilitada maneira de me fazer deslocar e ir bem mais longe. Assim passei a deslocar-me de triciclo, em casa, na rua, na companhia ou não de alguém. As minhas irmãs foram colocadas para estudar na cidade que ficava a trinta quilómetros, em casa de pessoas conhecidas e a quem o meu pai pagava a estadia. Eu fui descartado do direito de estudar. Tomaram-me por um inútil, inválido, sem direito a vida própria, alegando, o meu pai, que “a escola ficava longe e era necessária a protecção da minha mãe. Também, imagino eu, que para eles eu já não tinha qualquer préstimo e não valia a pena fazerem nada por mim”! Este era o raciocínio do meu pai, por causa do qual eu fui completamente negligenciado, despreocupando-se, os meus progenitores, de procurarem uma instituição onde eu pudesse estudar e integrar-me na sociedade. Por várias vezes, quando amigos do meu pai nos visitavam, ouvi-os dizer para ele: -“Foi mesmo azar, o único rapaz e ficar inutilizado!” O meu pai respondia-lhes sempre o mesmo: -“Pois é…fizemos de tudo o que estava ao nosso alcance, para o tratar mas foi impossível, enquanto formos vivos, seremos nós, quando morrermos terão que ser as irmãs a tomar conta dele”. O que ouvia não me agradava, porque na minha adolescência já me sentia muito atraído pelos estudos e na capital de Angola (Luanda) havia uma grande escola com internamento próprio, para reabilitação física e literária, onde os deficientes poderiam estudar e chegar mesmo a tirar cursos superiores. Esta escola era apoiada e comparticipada pelo Estado. Tudo o que dizia respeito a Geografia, História Universal, Matemática e Física fascinava-me. Aprendia sozinho, nos livros das minhas irmãs, quando acabavam o ano. Após terem deixado os estudos, porque só estudaram até ao quarto ano, excepto a mais nova, eu comprava livros de outras classes e continuava estudando isoladamente.
De vez em quando, víamos passar por entre a selva, com plantações de café por baixo de arvoredo de grande porte, um comboio movido a lenha que fazia o trajecto de Porto Amboim à cidade da Gabéla, transportando mercadorias e pessoal. Embora fosse muito lento, este dava uma imagem bonita por entre a selva e dos morros do Amboim. A cidade da Gabela e o Porto Amboim eram ligados por um caminho-de-ferro onde circulava este comboio movido a lenha. Dois homens seguiam, de pé, entre a fornalha e a vagonete que transportava a lenha. Iam colocando lenha e mantendo a chama bem acesa para que a caldeira de água continuasse a ferver, tipo panela de pressão, para que, com essa pressão, empurrasse os pistões para cima e para baixo a fim de, através dos êmbolos, fizesse mover as rodas. Nas subidas teriam que dar força á fogueira, na descida teriam que, com um balde, atirar com água para a fogueira acalmasse e assim obrigaria o comboio a andar menos. Lá subia e lá descia, por entre a floresta deixando para traz muito fumo, o comboio apitando e fazendo “Pouca terra Muita terra, Pouca terra muita terra… e toda a floresta, nas encostas dos morros do Amboim, sorria ao ver aquele Comboio passar. Nas aldeias, à beira da linha, toda a criançada corria para verem o bonito comboio passar. Pipiiiiiiiiiiiiiiiiii Pipiiiiiiiiiiiiiiiiii… e no Chindinde parava para sair e entrarem passageiros. Ali, nestas fazendas do Congulo, na “Quitona”, estávamos no mato, isolados de toda a civilização, não havia sequer uma escola por perto, mas sentia-me na floresta do "Tarzam", era o mais lindo lugar que alguém poderá imaginar!
Quando a Filomena fez um ano, o meu pai comprou-lhe um triciclo, mas assim que eu me sentei nele, com uma perna no chão com a qual me empurrava, e a outra, na qual não tenho força, que apoiava no quadro do triciclo, descobri que aquela era uma boa e facilitada maneira de me fazer deslocar e ir bem mais longe. Assim passei a deslocar-me de triciclo, em casa, na rua, na companhia ou não de alguém. As minhas irmãs foram colocadas para estudar na cidade que ficava a trinta quilómetros, em casa de pessoas conhecidas e a quem o meu pai pagava a estadia. Eu fui descartado do direito de estudar. Tomaram-me por um inútil, inválido, sem direito a vida própria, alegando, o meu pai, que “a escola ficava longe e era necessária a protecção da minha mãe. Também, imagino eu, que para eles eu já não tinha qualquer préstimo e não valia a pena fazerem nada por mim”! Este era o raciocínio do meu pai, por causa do qual eu fui completamente negligenciado, despreocupando-se, os meus progenitores, de procurarem uma instituição onde eu pudesse estudar e integrar-me na sociedade. Por várias vezes, quando amigos do meu pai nos visitavam, ouvi-os dizer para ele: -“Foi mesmo azar, o único rapaz e ficar inutilizado!” O meu pai respondia-lhes sempre o mesmo: -“Pois é…fizemos de tudo o que estava ao nosso alcance, para o tratar mas foi impossível, enquanto formos vivos, seremos nós, quando morrermos terão que ser as irmãs a tomar conta dele”. O que ouvia não me agradava, porque na minha adolescência já me sentia muito atraído pelos estudos e na capital de Angola (Luanda) havia uma grande escola com internamento próprio, para reabilitação física e literária, onde os deficientes poderiam estudar e chegar mesmo a tirar cursos superiores. Esta escola era apoiada e comparticipada pelo Estado. Tudo o que dizia respeito a Geografia, História Universal, Matemática e Física fascinava-me. Aprendia sozinho, nos livros das minhas irmãs, quando acabavam o ano. Após terem deixado os estudos, porque só estudaram até ao quarto ano, excepto a mais nova, eu comprava livros de outras classes e continuava estudando isoladamente.